A história mais trágica e melancólica de Sandman
Em um universo habitado por personificações de conceitos cósmicos, Sonho, Morte, Desejo e Destino, a história mais triste de The Sandman, de Neil Gaiman, não pertence ao protagonista sombrio, mas sim à caçula caótica e colorida: Delírio.
Delírio, com seus olhos desiguais e seu discurso errático, é a mais jovem dos Perpétuos e encarna a loucura. No entanto, a verdadeira tragédia está em sua origem: ela nem sempre foi Delírio. Houve um tempo em que ela foi Deleite, a manifestação da alegria pura, da beleza e do prazer inocente. A perda dessa inocência e a subsequente transformação no conceito de insanidade tornam a sua trajetória a mais melancólica e profunda de toda a saga.
O Sacrifício de Deleite
O mistério por trás da mudança de Deleite para Delírio é um dos enigmas centrais e mais tristes do cânone de Sandman. Embora a causa exata nunca seja totalmente revelada (o que intensifica o horror), as pistas sugerem um trauma cósmico ou um despertar doloroso para a realidade do universo.
A Queda da Inocência
Deleite existiu quando o universo era mais ingênuo e as coisas eram menos complicadas. Sua aparência original era a de uma criança feliz, o que simbolizava o início dos tempos e a alegria despreocupada.
A transformação sugere que, em algum momento, a Perpétua compreendeu algo fundamental e devastador sobre o universo e a humanidade: a alegria e a felicidade são mutáveis, inconstantes e finitas. Ela percebeu a inevitabilidade da dor e do sofrimento no mundo senciente.
Algumas interpretações sugerem que esse “amadurecimento” forçado ocorreu quando a humanidade desenvolveu uma consciência complexa, capaz de sofrer, sentir dúvida e mortalidade, contaminando a pureza do Deleite. Para escapar de uma tristeza tamanha que tornaria o sonho e a esperança impossíveis para os humanos, Deleite se tornou Delírio.
A loucura, nesse sentido, é a única válvula de escape possível da realidade caótica. A mente de Delírio se estilhaçou para que ela não tivesse que encarar a verdade sobre o universo que a machucou. A Delírio de hoje é um fragmento quebradiço da alegria que um dia foi, vivendo em um estado perpétuo de confusão para não sentir a dor da sanidade.
A Jornada de “Vidas Breves” (Brief Lives)
A história de Delírio que melhor encapsula essa tristeza é o arco “Vidas Breves” (Brief Lives), onde ela e Sonho (Morpheus) embarcam em uma jornada para encontrar o irmão desaparecido, Destruição (O Pródigo).
Solidão e Desespero Fraterno
Em “Vidas Breves”, Delírio está mais miserável e instável do que nunca. Ela se sente sozinha e marginalizada pelos irmãos, que frequentemente a tratam como a caçula incompreendida. O único Perpétuo que a tratou com gentileza e a viu com clareza foi Destruição, que abandonou suas funções há 300 anos.
A missão de encontrá-lo é, para Delírio, um ato desesperado para reparar sua família e se reconectar com a única pessoa que a fazia se sentir segura. Ela busca o conforto de um irmão que se recusou a cumprir seu papel, em uma ironia trágica, talvez por ter compreendido o peso insuportável de sua própria função cósmica.
Momentos de Lucidez Dolorosa
Durante a viagem caótica, a dor de Delírio se torna palpável. Há momentos raros e marcantes em que ela se “alinha” e recupera brevemente a lucidez. Ela se torna surpreendentemente coerente e capaz de aconselhar Sonho, que estava deprimido após o término de um romance.
Ao se acalmar, Delírio revela que essa coerência a machuca. É um lembrete cruel de quem ela já foi (Deleite) e o que perdeu.
Quando a missão falha e Destruição se recusa a voltar, a decepção de Delírio é imensa. Ela suporta o fracasso de sua busca e a perda de seu mentor/amigo, mesmo tendo perdido a sanidade por algo que parecia ser a dor da percepção.
O resultado de “Vidas Breves” é devastador para Delírio. Ela perde a chance de restaurar o vínculo com Destruição e assiste Sonho ser forçado a cometer um ato terrível (o assassinato de seu próprio filho, Orfeu), o que leva Morpheus à sua própria morte.
A tristeza de Delírio reside na sua eterna instabilidade, na impossibilidade de ser apenas alegre e no seu custo de existência: para que a humanidade consiga sonhar e ter esperança diante do caos (Delírio), ela precisou se quebrar (Deleite). Ela é a mais frágil e vulnerável dos Perpétuos, vivendo a vida como um eco distorcido de uma felicidade que se foi para sempre.
A história de Delírio é a lembrança de que, no cosmos de Sandman, o deleite puro é finito, e a insanidade é, por vezes, a forma mais triste de sobrevivência.
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